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O Ventor em África

Foi assim, em 1968, em Marrupa, no Niassa. Ficamos os dois frente a frente, envolvidos por um mundo dourado

O Ventor em África

Foi assim, em 1968, em Marrupa, no Niassa. Ficamos os dois frente a frente, envolvidos por um mundo dourado

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O Vexilóide de Alexandre Magno

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Marrupa 68: foi assim que ele me olhou


Na rota do meu amigo Apolo com o vexilóide de Alexandre Magno e o mreu Leopardo


Em áfrica, tudo é grande e belo. Podem ver aqui o meu menu africano



Um PV2. Havia destes no Niassa, em operação. Bom dia Tigres onde quer que estejam


Depois? Bem, depois ... vamos caminhando!

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14.02.06

Ainda o Ventor e o Medo


Quico e Ventor

Contar segundos à espera de ir pelos ares!

O medo, de vez em quando, perseguia o Ventor. Ele diz que não fazia nada por isso, mas ele aparecia. Caía do céu e pronto. E olhem que este caiu mesmo do céu! Diz o Ventor que desta vez os cães não lhe meteram medo. Desta vez foi ele que meteu medo aos cães. Então vejam o que me disse o Ventor:

«Eu tinha desafiado alguém para ir à caça, penso que foi o Sargento Dias, mas por qualquer razão, ele ou outro, ou não quis ou não pôde alinhar nesse dia. Chamei a Leoa e o Goldfinger e corri com os seus filhotes para trás para não nos incomodarem, pois muitos cães atrapalham mais que ajudam.

A Leoa, o Goldfinger e eu, seguimos direitos ao centro da pista para atravessar para o lado contrário. Ao atravessar a pista entrei na sua lateral de terra e comecei a penetrar numa zona de ervas e pequenas moitas , tipo carrascos. Como tinha chovido, um ou dois dias antes, nesse dia quente, o meu amigo Apolo secara as margens de terra lamacenta que acompanhavam a pista e já estavam sequinhas. Por essa razão, eu não ia de botas de água e ia ver como a lama ficava de repente dura que fazia parecer que já não chovia há dias, mas tinha chovido na véspera ou antevéspera.

De repente, vi o "cu gordo" de uma granada de morteiro (120mm? Lá grande era ela) enfiada no chão, incrustada na terra dura. Os meus olhos pareciam os olhos de uma ave de rapina quando olha a presa. Devem ter ficado esbugalhados! Chamei os cães para se manterem a meu lado. Pensei, imediatamente,  em fazer uma retirada para o AM 61 e tratar de mandarem tirar dali aquela coisa. Quando inicio a minha retirada, vejo outra coisa daquelas à minha esquerda. Exactamente igual! Quando penso em retirar pela minha direita, vejo outra! Formavam um triângulo quase perfeito. O receio torna-se em medo e o medo em pavor, ou quase! E isto porquê? Apenas porque pensei o pior e o pior para mim, naquele momento, foi pensar que, "os esfrelimos", lançaram a morteirada e não percebiam nada daquilo ou, por avaria, os morteiros não rebentaram. E o pior, seria eles irem lá, pé ante pé e armadilhar aquelas máquinas destruidoras. O pior estava pensado e o pior, leva-nos, sempre, ao medo.

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As granadas eram 3 semehantes a esta, enterradas no chão em triângulo

O nosso morteiro era um morteiro 60 ou 81

Assim, os meus olhos continuaram esbugalhados, ou esbugalharam ainda mais, quando comecei a procurar se entre as ervas, ou entre aquelas "sarças não ardentes", se encontrava algum fio que pudesse estar a armadilhar aquelas coisas terríficas, ligando-as. Por mim, se estivesse só, não teria medo, porque tinha muitas possibilidades de sair vencedor de algum eventual fio de Ariadne mas, com os cães à minha volta, comecei a ver a coisa preta. Eu, nessa altura, tinha olhos de lince e o eventual fio não me escaparia, pois se entrei ali sem o ver e as coisas não explodiram, era agora a minha vez de mostrar que teria vantagem sobre a sorte do imponderável anterior. Mas tinha o problema dos cães! Eles estavam estupefactos com a minha reacção e eu apenas queria que eles se mantivessem no chão quietinhos mas, não sabia se eles teriam coragem para me obedecer, enquanto eu procurava o tal fio ainda imaginário, mas provável.

Primeiro, fiz um jogo de guerra com os dois cães. O Gold olhava-me impávido e sereno e a Leoa estava muito nervosa. Virei-me para eles e disse-lhes: "não há aqui coelhos, nem raposas, nem nada. As codornizes já estão ali adiante, no meio do capim. Esta peça de caça só pode ser minha. Vocês não se mexam! Fiquem quietos"!

Eles perceberam que não se podiam mexer, senão, eu ficava chateado e isso eles não queriam. Pelo menos o Goldfinger. Foi pelo local dele que eu comecei a procura. Comecei dos meus pés para o Goldfinger e do Goldfinger para a Leoa. Nós encontrávamos-nos, aproximadamente, na base do triângulo. Se tínhamos passado ali e aquilo não rebentou, a parte pior era a zona da Leoa que era a que estava mais dentro. Disse ao Gold para se manter deitado e quieto e aproximei-me, pé ante pé, da Leoa com os meus olhos a varrer o solo todo até ela. Verifiquei a moita, junto, dela e nem réstia de fios. Pus-lhe a mão na cabeça e disse-lhe:"vem devagarinho comigo para junto do Gold e vamos buscar munições. Juntaram-se a mim e voltamos os três à pista com o Gold a rastejar a meu lado. Ali tive deveras medo quando pensava qual dos dois cães iria dar um tropeção no "fio imaginário" e, enviar tudo pelos ares, nós e a pista. Mas o Senhor da Esfera estava do nosso lado!

Eu adorava aqueles cães que nunca foram ensinados e obedeciam a tudo!

Cheguei ao AM 61 e contei a minha história da última meia hora. O primeiro foi o Sentinela do posto de ligação à pista. "Tem os olhos bem abertos. Qualquer coisa está mal"! Ele agarrou a arma com mãos de ferro, tirou os olhos dos meus e cravou-os na pista. Liguei para o Comando do Sector Alpha e pedi para falar com o Chefe de Operações. Era um Major cujo nome não recordo e pedi-lhe para enviar sapadores para retirar, pelo menos, 3 granadas de morteiros, que pensava serem de 120 mm, das margens da pista de Vila Cabral. Riu-se e parecia-me que estava a gozar comigo! Estava tão incrédulo como eu tinha estado até pensar na hipótese da armadilha e nas patas dos meus fiéis amigos a despoletarem aquilo tudo.

Nessa altura, o barulho seria tal que ninguém teria dúvidas sequer, e os sapadores só retirariam as nossas ossadas ao mesmo tempo que iriam olhando e pensando na virgem do Monte da Capelinha - lá longe - mas bem à vista da pista de Vila Cabral!

Nesse momento, já tinha na mão, uma "bazuca pacifista", uma cerveja MacMahon, garrafa verde e disse ao nosso Major que me conhecia relativamente bem, devido aos contactos que tínhamos pelos apoios da Força Aérea, às suas operações, para ver se os homens dele chegavam lá, enquanto eu bebia a bazuca! Perguntei ao Aeroporto de Vila Cabral se esperavam a chegada de aviões civis e, o nosso amigo Leiria, disse-me que não. Fiquei mais satisfeito, pois ainda não sabia se aquilo estava armadilhado ou não. Eu só tinha procurado o caminho para sairmos dali. Saí por onde entrei e ali não havia fios mas poderia, realmente, estar tudo armadilhado e até para fazerem que rebentasse à passagem de algum avião.

Com os nossos não ia haver problema e com os civis também não. Bebi a cerveja, respirei fundo e pedi ao Senhor da Esfera que ajudasse os sapadores na execução do seu trabalho.




O Ventor e a sua amiga cegonha, 1969, em Vila Cabral