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O Ventor em África

Foi assim, em 1968, em Marrupa, no Niassa. Ficamos os dois frente a frente, envolvidos por um mundo dourado

O Ventor em África

Foi assim, em 1968, em Marrupa, no Niassa. Ficamos os dois frente a frente, envolvidos por um mundo dourado

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O Vexilóide de Alexandre Magno

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Marrupa 68: foi assim que ele me olhou


Na rota do meu amigo Apolo com o vexilóide de Alexandre Magno e o mreu Leopardo


Em áfrica, tudo é grande e belo. Podem ver aqui o meu menu africano



Um PV2. Havia destes no Niassa, em operação. Bom dia Tigres onde quer que estejam


Depois? Bem, depois ... vamos caminhando!

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18.05.05

Uma Pantera Negra em Marrupa


Quico e Ventor

Uma beleza na savana!

Algures por terras de África , mais precisamente no Planalto de Marrupa, encontrei, em plena noite, uma Pantera Negra! Foi no verão de 1968, cerca das duas horas da manhã, numa noite de luar e Diana disse-me: "essa é tua Ventor"!

Na noite da savana, a nossa pantera negra possuía dois olhos como duas lanternas, de costas para Diana e virada para o nosso jipe. Estática, nada enxergaria encandeada pelos faróis máximos que o Tavares apontou sobre ela. Só, na noite do tempo, perante luzes tão fortes, aquele animal, negro e belo, fazia reflectir no pêlo brilhante do seu lombo a luz que Diana sobre ele fazia incidir. Era uma imagem majestática, apenas denegrida pelo despudor do Tavares em atirar com o Jipe para cima daquela imagem inolvidável!

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Pantera negra

Uma beleza em África

O Tavares, condutor da FAP no AM62, dava a impressão que morria de pavor frente a esse bicho! Nessa altura, o Tavares, estava habituado a outra Pantera Negra, mas essa era pacífica e imaginária - o nosso Eusébio - e essa outra, que ele tinha, nesse momento, na retina e em frente do nariz, era real, verdadeira e sabe-se lá, perigosa até quanto!

Nessa noite, ouvi, na rádio da Força Aérea, um apelo de guerra! Algures, no meio da selva, lá longe, as nossas tropas pediam ajuda. Eram cerca das duas da manhã de uma noite linda que até fazia dó! Na noite brilhante, Diana espraiava-se sobre a selva, linda como sempre, ou mais linda que nunca! Meti um papel no bolso de uma camisa de café com leite, dirigi-me às camaratas e fui acordar, de mansinho, o Tavares, condutor de serviço no AM62, após várias tentativas de comunicar, por rádio e telefone magnético com o Comando militar mais Central e avançado de Moçambique, sem sucesso. «Tavares, acorda», disse-lhe. "Tens de ir comigo ao comando do Sector Echo"! O Tavares olhou o relógio e nem queria acreditar! "Estás doido? A estas horas? Quem vai mais"?

"Não vai mais ninguém. Vamos os dois e não temos medo. Arranca"! O Tavares era um homem do Norte, algures de Trás-os-Montes e achava, como muitos outros, que estava a desperdiçar a sua juventude, naquela guerra pantanosa de África. A refilar, foi-se levantando, esfregando os olhos, vestindo-se, calçando-se e, mal humorado, ia olhando o relógio, como que com esperança que o nosso amigo Apolo se adiantasse na máquina do tempo!

"És doido! Sozinhos, daqui até ao fim do mundo com leopardos, leões e tantos bichos que, se calhar, nem sabemos que existem; num jipe aberto, em plena selva, numa picada de caca, que nem dá para dar a volta para trás! E aqueles gajos todos a dormir e os meus pais sem saberem os perigos que o filhinho deles corre, nesta noite linda e brilhante de luar mas que, para mim, é mais negra que a África"!

O fim do mundo do Tavares, eram cerca de uns míseros 15kms até à localidade e mais um pedaço até ao comando do Sector E.

A meio da picada, o que o Tavares mais temia! Um leopardo! Só que, destes, ele nunca tinha visto. Preto retinto - "a nossa pantera negra" - disse-lhe. Estava atrapalhada com os faróis do jipe, estática no meio da picada. Pensei não fazer fogo e disse ao Tavares para ter calma e permitir que o bicho fugisse, mas não! Acelerou a fundo e partiu para cima dela! Pareceu-me ouvir o impacto do jipe no bicho mas talvez tenha sido impressão. Apesar do luar, era uma zona de árvores sobre a picada e fazia-se algum escuro com as sombras, mas eu não me apercebi por onde o bicho fugiu. Será que se safou a nossa pantera negra?

Prosseguimos. De arma feita ao fogacho, eu observei a floresta, em volta, mas nunca mais vi nada e voltei-me de repente para trás para defender a nossa retaguarda de uma possível investida, ao mesmo tempo que me apetecia apertar o pescoço ao Tavares pela mariquice de atirar com o jipe para cima de uma raridade daquelas! Pela única vez na minha vida, que tive oportunidade de ver uma pantera negra, na selva, em plena noite, e não tive a oportunidade de melhor apreciar, tão grande e tão raro valor cinegético, para transportar nas minhas retinas, com mais força e clareza, pela vida fora.

Depois de ver um animal semelhante a este e toda a sua desenvoltura à luz do luar de Marrupa, ainda hoje lamento a insensatez do meu companheiro de guerra que era um bom rapaz mas, demasiado insensível para tão bela, embora arriscada, caminhada. A zona era perigosa, relativamente aos animais selvagens e não só, mas era perfeitamente viável deixar a nossa pantera prosseguir na sua caminhada e vê-la reentrar nas lânguas da sua savana!

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Imagem trabalhada de uma pantera negra. Na noite de Marrupa, com um luar muito fraquinho, quase só víamos os olhos

O Tavares, tal como eu, sabíamos que o jipe aberto não nos dava a mesma garantia que um jipe fechado. Mas o risco era o pão nosso de cada dia. Naquele local, eu só, armado e quatro cães, em pleno dia, fomos apedrejados por 18 macacos! Consegui recuar e entrar na picada sem dar um único tiro.

Ao chegar à porta do Comando do Exército, o Tavares achava que eles não nos iam abrir a porta, mas enganou-se. Abriram-nos a porta e ainda fizeram do Tavares um herói por tentar atropelar o nosso bicho negro - a nossa pantera! Enquanto eu e o Oficial de Dia decidíamos se devíamos acordar o Comandante do batalhão ou não valia a pena, mas valeu, e tomei nota da ajuda que eles iam precisar da parte da Força Aérea, ao nascer da aurora. O nosso amigo Tavares já tinha quase toda a unidade acordada com a sua história da nossa pantera. Quando me viu sair direito ao jipe e digo "vamos", verifiquei que as suas pupilas estavam atormentadas e que toda a valentia que ali exibira, se tinha esfumado num ápice!

"Sózinhos"!? Perguntou o Tavares. "Sim! temos a pantera à espera", disse-lhe.

Voltamos a fazer o trajecto ao contrário, sem ver mais qualquer pantera negra, cor de rosa ou de outra cor qualquer!




O Ventor e a sua amiga cegonha, 1969, em Vila Cabral